(uma entrevista)
Por Nicolleta Maquiavelha
Magnânima Raynha das Pantalhas, é atribuída à senhora a expressão “roubar é relativo”. A senhora confirma?
Em primeiro lugar, minha cara Maquyavelha, chame-me de Pryncesa, pois eu estou divorciada, e me divorciei justamente para voltar a ser pryncesa e encontrar a minha realidade encantada, que poderá vir na forma de um pryncipe, mas eu acho que não. Acho que virá na forma de algo mais sutyl e dygno de meus ydeays.
E como credes que vos chegará essa realidade, Encantada?
Acho que virá na forma de sete anões, carregados de diamantes. Lembro que sete é um número cabalístico que pode ser qualquer outro (espero que maior, hyhyhy), e por isso muitos se confundem e o chamam o número do mentiroso, como, aliás, muitos se confundem sobre o meu governo, que também é cabalístico.
Como assim, Pryncesa, como é que seu governo é cabalístico?
Ora, minha queryda, eu tenho os três grandes poderes: executyvo, legislatyvo e judyciário, e o quarto poder me tem e o tenho em altyssimas contas e estymas, sou portanto plenypotenciária, pois incorporo e represento os interesses e os poderes de toda a olygarquia. Três poderes e mais o quarto são sete, o que representa, como já disse, qualquer número, portanto todos os números. Resumindo, eu posso fazer toda e qualquer coysa no meu governo.
Divorciar-se da realidade teria sido então uma demonstração dessa força?
De força não, meu anjo, de cryatividade e ynovação, pois bem sabes que estava anunciado: eu vim para trazer o novo jeyto de governar.
Pryncesa, voltanto à pergunta inicial, a senhora teria dito que “roubar é relativo”?
Minha Maquyavelhynha, matar é relativo, pois que toda morte matada pode ser um suicydio, já que quem é suicidado mata a si mesmo, portanto auto-comete morte matada e ponto final, não carece nem de autópsia, nem necessita de investigação maior que aquela pro forma, pois é uma coisa que fica evidente desde a primeira declaração de qualquer ex-primeiro-marydo, por exemplo. E se matar é relativo, minha Maquya, roubar então, é questão menor. Roubar, além de relativo, em muitos casos é praticamente uma necessidade básica, como o vestido de tubinho. Eu, quando vejo o povo com fome, sem terras, sem teto, sem educação, mal atendido na saúde, sinto ganas de roubar. Muitas ganas sinto. Claro que na minha posição de governante, eu não demonstro isso. Mas creio até que seja uma compulsão natural do ser humano, não é?
Creio que sim, mayestade.
Então tenho que falar com meu médico sobre isso.
A senhora está tomando alguma medicação, fazendo algum tratamento?
É claro que quem vai a médico toma remédio, Velha, ou por acaso seria só eu que indo a médico tomaria remédios?
Desculpe, Pryncesa, minha intenção não era salientar uma obviedade desimportante, mas saber como a senhora se sente, se está contente com o tratamento?
Estou me sentindo ótima: livre, leve e solta. O Dr. Astúrias é um amor, sabe, daquele tipo de médico que fica preocupadíssimo quando o paciente não toma a medicação. Eu adoro quando ele se preocupa comigo. E antes que me perguntes: não, Astúrias não é o nome verdadeiro dele. Só eu é que o chamo assim, pois ao vê-lo achei-o com cara de crisântemos e crisântemos sempre me lembram Astúrias.
Pryncesa, embora nos jornais, rádios e tvs ninguém jamais comente isso, pois são todos seus verdadeiros amigos e admiradores, na Internet em alguns blogues estão dizendo que a senhora é a responsável pelo povo estar recebendo menos educação, menos assistência à saúde, menos segurança, menos empregos...
Pááára! Páára por ay, Maquyavelha! Estás me dando ganas! Ganas! Se não quiseres ser esfolada e depenada viva ou morta sai da minha frente agora. Ai, ai, Astúrias! Chamem o Astúrias! E não me diga que o povo passa fome, Maquyavelha, pois eu sou capaz de fazer uma loucura. Ainda não tomei meu remédio hoje e posso matar e roubar o primeiro - ou a primeira, viste? - que passar na minha frente. Sai! A entrevista está terminada!
(Texto psicoteclado por Carlo Buzzatti, com o auxílio de Gasparzinho Dutra, o fantasminha camarada da Polícia Federal, que investiga as assombrações do Piratini) .
FONTE: Jean Scharlau
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