A esquerda espantada e os privilégios para
classe média
por Miguel
do Rosário
Coluna Cafezinho com Wanderley
As máscaras do
conservadorismo
Por Wanderley Guilherme dos Santos,
cientista político
Com uma esquerda que debanda ou adere ao primeiro berro
selvagem da direita, não surpreende que as instituições representativas,
Legislativo e Executivo, respondam um tanto como baratas tontas, um tanto como
gatos tentando surrupiar sardinhas. Medidas aprovadas por coação antes que por
convencimento nem sempre acertam a dose ou mesmo o alvo pretendido. Os dois prá
lá dois prá cá na alocação dos recursos futuros do petróleo à saúde e educação,
por exemplo, podem estar contratando problemas futuros de não pouca monta.
Hospitais sem aparelhos ou médicos a contento serão focos de insatisfação antes
que unidades prestadoras dos serviços esperados. O mesmo se diga de unidades
escolares, em qualquer nível, sem apoio logístico material e pessoal
apropriado. Falar em pessoal equivale a introduzir o tema da remuneração do
serviço público, cujo montante é sempre considerado absurdamente elevado pela
mesma classe média a pedir melhor atendimento nos hospitais que, aliás, não
freqüenta. Exigir melhores serviços públicos e ser contra as medidas – impostos
e salários públicos dignos – necessários à sua materialização é típico dos
conservadores, expresso na tese de que Rousseaus, altruístas, são os outros,
bastando-lhes o magnífico egoísmo individualista de Adam Smith.
Em algum momento a aprovação do passe
livre universal para estudantes – não apenas para os do Pró-Uni – há de ser
devidamente analisado. Enquanto os trabalhadores sem carteira assinada e os que
trabalham por conta própria não forem cobertos por um programa distributivo do
tipo “vale-transporte” – financiado este pelo empresariado aos que possuem
carteira assinada -, o passe gratuito universal para estudantes será, em larga
medida, um privilégio dos rebentos da classe média. Não esquecer que a demanda
por tarifas subsidiadas para estudantes se repete anualmente há quase cem anos,
em busca do mesmo mimo, assim como o pagamento de meia-entrada em centros de
diversão. O problema crucial do trabalhador com carteira assinada não é o custo
da passagem, mas o custo em tempo e desgaste físico do trajeto
casa-trabalho-casa. Mas ai, prezados, o problema não está só do lado dos
legisladores suscetíveis a suborno, mas também dos corruptores sobre os quais
os anônimos não dão um pio: empreiteiras, imobiliárias, bancos, que destruíram
a civilidade de nossas grandes metrópoles. Enquanto nos Estados Unidos a
população, sabendo onde mora o perigo, ocupa Wall Street, aqui os muito bem
treinados mascarados conduzem a multidão a depredar Assembléias Legislativas,
justamente as Casas criadas para ajudar a defender os vulneráveis dos instintos
canibalescos dos mercados.
E a cereja do bolo: a reforma
política – a mais peçonhenta manobra sacada por políticos acuados para escapar
a uma prestação de contas de respeito. No caso atual, não há nem uma proposta
em circulação que seja nova ou que aumente a liberdade dos cidadãos. Ao
contrário, várias visam justamente reduzir sua capacidade de intervenção.
Enquanto necessário escreverei às terças e quintas analisando o perjúrio em
andamento.
via O Cafezinho
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